A ciência comportamental ajuda-nos a perceber as peculiaridades do nosso comportamento, que vão muito além das nossas decisões, especialmente a razão porque decidimos fazer uma coisa e fazemos outra diferente.
Importa ter em conta que todos nós somos seres limitados com atenção, memória e vontade limitadas. A forma que as nossas mentes (1 e 2) utilizam para contornar estas limitações é com recurso a atalhos que nos permitem economizar trabalho e ocupar menos recursos. No entanto, esses atalhos levam-nos muitas vezes a erros de inação e erros de ação não intencional.
A literatura refere o hiato entre intenção e ação (intention-action gap) como um dos maiores erros de inação. Todos nós já sentimos este hiato duma forma ou de outra. Todos conhecemos alguém que paga todos os meses a mensalidade do ginásio sem nunca lá ir, ou que comprou um equipamento para fazer ginástica em casa que nunca usa.
Acham que eles gostam de gastar dinheiro só por gastar? Eles queriam mesmo começar a ir ao ginásio quando fizeram a inscrição ou compraram o equipamento, no entanto nunca o fizeram. Os benefícios de fazer exercício continuam a existir e estão claros nas suas cabeças, o pior é que muitos deles ainda continuam a acreditar que vão começar no próximo mês, depois das férias, ou logo depois da festa de aniversário. No entanto, alguma coisa vai acontecer que compromete essa vontade e interfere com a motivação. Por isso vão continuar a pagar e não ir ao ginásio.
Com o hiato de intenção-ação, a intenção está lá, mas as pessoas não agem em conformidade. Isto não significa que as pessoas não sejam sinceras ou se enganem propositadamente. O hiato existe devido à forma como as nossas mentes funcionam e demonstra uma das principais lições da ciência comportamental: boas intenções e o desejo sincero de fazer algo não são suficientes.
Isto acontece muitas vezes nas nossas empresas, equipas que estão motivadas, que saíram das nossas reuniões de objetivos cheias de boas intenções, mas que após alguns dias ou semanas de trabalho, perdem o foco.
E a ação não intencional? Atenção que não estamos falar de rebeldia ou algo de que nos arrependamos no dia seguinte. Falamos de comportamentos que não queríamos ter, mas ainda assim temos, porque não nos damos conta ou porque não pensamos neles. São essencialmente hábitos.
Os nossos hábitos permitem-nos agir sem pensar, como andar de bicicleta, conduzir um carro ou utilizar um telemóvel. No entanto, por vezes também correm mal. Todos conhecemos alguém viciado em comer guloseimas, ver séries na televisão, fumar (existem estudos que confirmam que o hábito de fumar é mais poderoso do que o vício em nicotina) ou utilizar redes sociais. Mas os hábitos, como padrões de comportamento aprendidos ao longo do tempo, são neutros. Aprendemos maus hábitos da mesma forma que aprendemos bons hábitos: através de repetição. As nossas mentes automatizam determinado comportamento de forma a poupar trabalho cognitivo e energia.
Tentem imaginar um mundo em que não existiam hábitos, em que tínhamos de pensar cuidadosamente todas as decisões que tomamos, todas as ações, como se estivéssemos a conduzir um carro pela primeira vez. Ficaríamos exaustos muito rapidamente.
Por isso criamos hábitos de trabalho e rotinas que nos permitem chegar ao fim do dia sem estar exaustos. No entanto, nem sempre são os melhores hábitos do ponto de vista de produtividade e otimização do nosso tempo. O hábito de beber café a meio da manhã com os colegas pode interromper um período bastante produtivo. O hábito de verificar todos os mails quando entram na caixa ou as notificações do telemóvel quando são recebidas são uma interrupção constante que desvia a nossa atenção da tarefa que estamos a desempenhar.
Nós não podemos confiar nos nossos hábitos nem pedir aos nossos clientes que deixem de seguir os seus. No entanto, conhecendo os nossos hábitos, podemos tentar reconhecer os dos outros e tentar perceber de que forma os podemos utilizar ou contornar esses hábitos, desenhando os nossos produtos ou serviços de forma inteligente e adaptada.
Temos de perceber os atalhos que os nossos clientes utilizam, os hábitos que desenvolveram com o produto ou serviço que vendemos e o hiato existente entre as suas intenções e as suas ações. Conhecendo melhor o seu processo de decisão, podemos tentar desenhar a melhor forma de alterar o seu comportamento, modificando o contexto e influenciando as suas decisões.
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